quarta-feira, 29 de agosto de 2018


De 2011 pra cá

Com o passar dos anos, o Gmail tem servido mais como apoio para acessar outros serviços da Internet do que meio de comunicação com os amigos. Por meio dele confirmo assinaturas, redefino senhas, recebo e arquivo comprovantes de pagamentos.

Mantê-lo ativo e operante ainda é muito importante. No meu to-do-list semanal encontram-se com frequência: limpar a caixa de entrada, conferir se há algo perdido no ‘spam’, deletar tudo o que não presta de lá, manter a casa em ordem. Afinal tenho diversos aplicativos associados à conta Google e o endereço Gmail é, em grande medida, meu canal de acesso a todos eles.

Mas cada vez menos me correspondo por e-mail com “pessoas de carne e osso”.

Essas que um dia abracei ou aquelas que um dia poderei abraçar.

O resultado disso é que meu coração não anda mais por ali. Minhas relações afetivas não falam mais comigo pelo Gmail.

Meu pai morreu ano passado e foi o último dos moicanos. O velho pai, lá do Rio de Janeiro, usava basicamente o Gmail para falar comigo, aqui em Brasília. No início escrevia sem abreviações e by the book, com o tempo foi aderindo aos vc, para ‘você’, fds, para ‘fim de semana’, sds, para ‘saudades’. Ele já evitava o recurso fácil, porém ‘ruidoso’, da CAIXA ALTA, quando na verdade só queria chamar a atenção para algo. Não se desculpava mais pelos erros de grafia (evidentes typing mistakes). E maravilha das maravilhas da missiva digital: aprendeu a ir direto ao ponto.

Morreu antes de se adaptar inteiramente ao WhatsApp, embora já caminhasse com competência naquela direção...

Mas ele se foi. Com ele, a expectativa de encontrar na caixa de entrada algo do tipo: “te amo”, “sds”, “quando você vem me visitar? ...

Assim cuido apenas de manter o Gmail alive. Garantir um meio para recuperar as senhas das quais por sinal sempre me esqueço.

Até que recentemente recebi uma mensagem eletrônica intrigante.

Por pouco não detonei logo-de-primeira a mensagem cujo título-robô informava: Solicitação de inscrição de comentários do blog “Blog Silva”.

A primeira coisa que me ocorreu foi suspeitar do truque bobo: “Quando na vida eu iria me importar com a assinatura de um tal Blog Silva?!” O ímpeto inicial era devolvê-la para as masmorras do spam e destina-la ao ‘delete forever’.

A lembrança remota de algum Blog Silva, no entanto, me interrompeu.

Resolvi arriscar. Abri a mensagem. Só que, uma vez mais, o ímpeto do “delete” veio à tona. Pois me deparo com o remetente esquisito: noreply+subscribe@blogger.com.

Mas com a mensagem aberta foi inevitável correr a vista pelo texto. Queriam saber se eu ainda queria receber notificações por e-mail quando novos comentários do blog Blog Silva fossem publicados...

Nada me pareceu mais singelo. Já vejo, leio e assino tanta ‘besteira’, que mal me faria então um novo post do Blog Silva? Além do mais, o pobre Blog só queria saber se eu queria continuar recebendo notícias dele.

Blog Silva.

“Já ouvi falar em você, Blog Silva? ” Me perguntei. “Sim”. Alguma parte da mente respondeu.

O termo Blog Silva estava sublinhado no texto da mensagem eletrônica. E em cor azul. Era um link. Então cliquei no link e ele me direcionou para a página inicial do blog: http://fredericoloal.blogspot.com.

Meu Deus! O fredericoloal ali sou eu. Eu sou o Frederico Loal para muitos fins na Internet. Meu Hotmail e meu Gmail tem esse nome de usuário.

Até aquele momento eu caminhava para abrir a porta. Quando finalmente a abri, encontrei comigo mesmo do outro lado da soleira.

O paupérrimo blog fora criado por mim. Nele, só três artigos. Um deles simplesmente com duas palavras e reticências: ‘De luto...’ O outro transcrevia a poesia do Carlos Drummond de Andrade ‘A flor e a náusea’. O terceiro, com aproximadamente 400 palavras, gritava contra a procrastinação.

Este último texto fora escrito 2 de dezembro de 2011. Havia portanto sete anos que eu anunciava ao mundo o começo de um novo projeto.

Mas, iniciar quando? “Agora”, dizia o post.

Bem, aquele 'agora' já dura sete anos.
 
Aproveitava o exemplo de atitude de Nick Vujicic para me declarar comprometido com o propósito de me levantar e não desistir dos meus sonhos.

 
Naquela época minha filha tinha dez anos. Hoje ela tem dezoito. Eu tinha 40. Hoje, tenho 47. Eu tinha sonhos e ainda tenho. Eu queria correr atrás deles. Ainda hoje quero.

Senti vergonha com a falta de comprometimento comigo mesmo. Mas, com 47 anos, tenho pressa.  

Nesse meio tempo pelo menos aprendi a me aceitar mais e a me culpar menos.

Volto ao Blog Silva para dizer que aquele projeto ainda está de pé. E que estou renovando a assinatura imediatamente.